– Traficantes, milícias… Não existe lado bom nessa história.
– Mas talvez exista o lado menos ruim.
– Acássia, não existe lado bom.
(Um diálogo pós-telão com a sábia Ariana Maurício)
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José Padilha, diretor dos dois filmes da série Tropa de Elite, disse recentemente em alguma entrevista que gostava de fazer “filme político”. E Tropa de Elite 2 é um desses filmes, perturbador desde antes da primeira cena, com aquele aviso que já conhecemos (ironia?): “Qualquer semelhança com a realidade é apenas uma coincidência. Esta é uma obra de ficção“.
Uma produção muito bem feita, sou mais uma a engrossar o coro. Belas cenas, personagens muito bem construídos, um roteiro convincente – e quem sabe mais sobre cinema do que eu pode enumerar as outras boas (ou não) características cinematográficas do filme brasileiro.
Mas nada se compara ao prazer da discussão pós-telão. Nada se compara ao prazer de ver um capitão – agora coronel – Nascimento convivendo nas entranhas do poder. Claro, é ótimo ir ao cinema e poder relaxar, ao lado de uma boa companhia, com um “Comer, Rezar e Amar”. Melhor ainda é refletir sobre um “Tropa de Elite 2”.
Por exemplo, o quase inevitável sentimento maniqueísta que insiste em querer aflorar na consciência (talvez fruto da muitas vezes triste experiência como eleitor/a no Brasil): seria o forte esquema criminoso do tráfico de drogas “menos ruim” à população que o forte esquema criminoso das milícias? Ou o inverso? Um simples argumento desbanca o questionamento medíocre: não existe lado bom.
#Fato
Às margens (mas integrada) de um sistema econômico cruel, sem água, energia elétrica, internet a preço acessível e outros serviços que deveriam estar na lista de prioridades das políticas públicas no Brasil, resta à população ficar à mercê de quem ofereça tais serviços, sejam estes bandidos uniformizados ou não. Uma pena. Tanto quanto a lamentável constatação de que, em nosso querido país sem Educação eficiente, é esse o preço de muitos mandatos políticos a cada dois anos, inclusive muitas vezes com o apoio da mídia. Isto não é mera coincidência, Padilha.
Aproveitando o gancho financeiro, paguei R$ 12 pelo ingresso no cinema*, mas foi impagável ver nossa Brasília estampando um das cenas finais do filme, ao som da narração do protagonista interpretado por Wagner Moura. Desolador? Um bocado. Mas o filme trouxe junto um tanto daquele sentimento de esperança que nos fortalece em muitos momentos.
Começando pelo fato de podermos assistir nos cinemas brasileiros um filme nacional como Tropa de Elite 2. Não, não estou achando que isso é muito. Afinal, vivemos nos orgulhando de que o país cada vez mais consolida a sua democracia e liberdade de expressão e pensamento. Mas também não devo crer que isso é insignificante. Afinal, as ameaças à liberdade de expressão e pensamento estão sempre por aí, nos rondando. Não é mesmo, coronel Nascimento?
Continuando. Também é esperançoso ver, mesmo que no telão, um deputado Fraga, eleito democraticamente, à frente de uma CPI verdadeiramente comprometida em solucionar um caso escabroso de corrupção dentro do poder público. Só posso desejar e acreditar, pelo bem da minha breve existência por estas bandas, que também isto, Padilha, não seja somente mera coincidência.
* Novo cinema Lumière, no Shopping Farol. Gostei.
😉